De avenida fantasma a reduto dos excluídos: a reocupação da Avenida Hercílio Luz

A luta de jovens periféricos pelo direito ao lazer enfrenta estigmas sociais e repressão policial

Quem caminha pela atual avenida Hercílio Luz, pavimentada e arborizada, muitas vezes não conhece o quanto tal cenário mudou nas últimas décadas.

Onde hoje reina o cimento e concreto, havia água, trabalho braçal e muito samba. 

O antigo Rio da Bulha era ponto de encontro das lavadeiras da região central da ilha, que utilizavam a água que vinha do morro para dar conta da limpeza das roupas da família ou dos clientes. 

A transformação da paisagem acompanhou o crescimento da capital: com uma expansão urbana acelerada, o centro da cidade se esparramou para o leste do centro, levando a canalização do Rio da Bulha, em 1920. Em 2005, o canal do Rio da Avenida foi totalmente coberto.

Rio da Bulha em 1920. Foto: Adolfo Nicolich, Acervo Velho Bruxo.

Rio da Bulha em 1920. Foto: Adolfo Nicolich, Acervo Velho Bruxo.

Canal do Rio da Avenida. Foto: Carlos Damião

Canal do Rio da Avenida. Foto: Carlos Damião

Em 2005, o canal foi totalmente coberto. Foto: Daniel F.M.

Em 2005, o canal foi totalmente coberto. Foto: Daniel F.M.

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Rio da Bulha em 1920. Foto: Adolfo Nicolich, Acervo Velho Bruxo.

Rio da Bulha em 1920. Foto: Adolfo Nicolich, Acervo Velho Bruxo.

Canal do Rio da Avenida. Foto: Carlos Damião

Canal do Rio da Avenida. Foto: Carlos Damião

Em 2005, o canal foi totalmente coberto. Foto: Daniel F.M.

Em 2005, o canal foi totalmente coberto. Foto: Daniel F.M.

Como consequência desse processo, veio a favelização. Os moradores da região, em sua maioria descendentes de ex-escravizados, foram empurrados para o maciço do Morro da Cruz, formando comunidades como os morros do Mocotó, da Mariquinha, Monte Serrat (Morro da Caixa) e Morro do Céu.

Enquanto um mundo se desenvolvia lá em cima, a vida continuava na Avenida Hercílio Luz - agora branca e higienizada. Nos anos 70, a região se tornou alvo de um boom imobiliário sem freios, regras ou planejamento urbano. 

Ocorreu então uma chuva de construções de prédios residenciais. Visando o potencial de lucro gerado por morar no centro, alguns contam com uma dezena de apartamentos em cada andar, ocupando 100% do terreno. Formou-se então um paredão de edifícios com nomes femininos: Ana Paula, Carolina, Cristina, Andréa, Gabriela, Bianca, Alexandra, entre outros.

Ao lado do Imperial Hospital de Caridade, o Morro do Mocotó, em 1940. Foto: Acervo Carlos Damião

Ao lado do Imperial Hospital de Caridade, o Morro do Mocotó, em 1940. Foto: Acervo Carlos Damião

Prédios do paredão da Hercílio Luz, e ao fundo, Morro do Tico-Tico, em 1972. Foto: Acervo Carlos Damião

Prédios do paredão da Hercílio Luz, e ao fundo, Morro do Tico-Tico, em 1972. Foto: Acervo Carlos Damião

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Ao lado do Imperial Hospital de Caridade, o Morro do Mocotó, em 1940. Foto: Acervo Carlos Damião

Ao lado do Imperial Hospital de Caridade, o Morro do Mocotó, em 1940. Foto: Acervo Carlos Damião

Prédios do paredão da Hercílio Luz, e ao fundo, Morro do Tico-Tico, em 1972. Foto: Acervo Carlos Damião

Prédios do paredão da Hercílio Luz, e ao fundo, Morro do Tico-Tico, em 1972. Foto: Acervo Carlos Damião

Um novo cenário

Avenida Hercílio Luz, 2022

Foto: Wikimedia

Foto: Wikimedia

Cerca de 50 anos depois, a cena, de novo, mudou. A antiga avenida fantasma hoje é uma das mais movimentadas da cidade.

Porém, resultado de uma cidade que falhou em se organizar, a avenida Hercílio Luz hoje é um espaço de disputa entre uma população branca e classe média que vivem nos prédios residenciais, e jovens periféricos que ocupam as ruas reivindicando seu direito a lazer.  

Quando o relógio marca as 17h, a avenida é composta por um público diverso: são estudantes, trabalhadores, idosos, mães buscando seus filhos, e pais de pet passeando com animais domésticos pela rua. 

Às 18h, enquanto cada grupo segue seu rumo, a agitada Hercílio Luz se torna palco do início de um conflito recorrente. Enquanto jovens se amontoam nas ruas, calçadas e bares, os vizinhos já estão em suas janelas, aflitos para discar 190. 

À 00h, os bares da região encerram seu expediente, cumprindo as exigências do alvará de funcionamento. Entre às 2h e 3h, a polícia militar rodeia a região para dispersar, às vezes violentamente, aqueles que insistem na vida noturna de Florianópolis - a capital que dorme cedo.

Dados retirados da reportagem "Florianópolis, capital que dorme cedo", de Camila Saplak.

Dados retirados da reportagem "Florianópolis, capital que dorme cedo", de Camila Saplak.

Em contraste às regiões de alto custo de vista, como o norte da ilha, o centro de Florianópolis não comporta uma vida noturna satisfatória.

O espaço público mal planejado resulta em um ambiente desconfortável, pouco seguro, gerando conflito entre moradores e comerciantes locais. 

Não há nenhuma iniciativa do poder público para resolver o problema. Em uma cidade extremamente cara, conservadora e racista, lazer é só para quem pode pagar. No decorrer da história, o centro da cidade se mantém excluindo os excluídos. 

A juventude negra, periférica e LGBTQIA+, segue ocupando estes espaços, celebrando suas existências - nas mesas de plástico, com uma cerveja gelada na mão e uma caixa de som ao lado. 

A seguir, conheça alguns dos principais bares da região:

Bar do Alemão

O melhor bar do mundo.

Foto: Gabriele Oliveira

Foto: Gabriele Oliveira

Pontualmente às 23h40, de segunda a sábado, o bar do Alemão encerra o atendimento.

Além da cozinha, banheiros e do ambiente interno, os funcionários seguem a rotina de organizar o exterior. Recolhem as mesas e cadeiras, limpam a calçada e recolhem todo o lixo. 

Para Antônio Salum, o Alemão, esse é um dos diferenciais que tornam o local o melhor bar do mundo.

O primeiro Bar do Alemão surgiu na Palhoça, na Grande Florianópolis, com uma forte venda de lanches e porções. Em 2018, quando soube de um ponto disponível no centro, Antônio não deixou a oportunidade passar.  

Desde então, o Bar do Alemão se tornou um dos mais populares da Hercílio, sendo ponto de encontro entre diversos públicos diferentes. Contando com quatro funcionários, além do proprietário, figura presente no expediente, o Bar do Alemão é um ambiente familiar.

“Existem pessoas que têm setenta e cinco e sempre vem ao meu bar para tomar uma cerveja. Tem famílias que trazem o filho de dois anos, três anos. Tem também pessoas de dezoito anos, dezenove, que sempre vem. É um bar aberto, mas é um bar familiar.”

E assim como nas casas de cada família, existem regras para manter o local organizado. No Bar do Alemão, não é permitido consumir maconha ou utilizar caixas de som nas mesas. O horário de fechamento precisa ser respeitado por todos, em respeito a vizinhança. 

“A gente está numa área de residências. Se o proprietário ficar atrás de um caixa, pensando em ganhar dinheiro, eu não vejo meu bar lá fora. Quando eu não vejo meu bar lá fora, tu como cliente faz o que quiseres.” 

A disciplina de Antônio faz com que muitas pessoas achem que o Bar do Alemão é um ambiente conservador. Apesar de saber que essas regras afastam uma parte do público, Antônio acredita que elas são necessárias para harmonizar o bar com a sociedade, respeitando quem vive ou passa pela região. 

“Hoje existe uma lei que não permite fumar maconha ao ar livre. Em lugares públicos, a responsabilidade é da segurança pública. Mas as mesas são de minha responsabilidade. Então a gente pede com muito carinho e respeito para que esse ato não seja efetuado. Vai lá, dar uma volta, depois tu vem aqui”, explica. 

Respeito, qualidade no atendimento, na comida e na bebida e a ausência de conflitos com a polícia são alguns dos fatores que, para Antônio, diferenciam o Bar do Alemão de todos os outros bares do centro. 

Apesar de pequeno, a estrutura tem muito a oferecer: mesas internas e externas, quatro banheiros que são limpos durante a noite, banheiro e rampa de acesso para PCDs. No cardápio, diversos drinks e petiscos, como porções de batata frita, aipim ou polenta, além dos tradicionais hambúrgueres. No inverno, o diferencial é a venda de caldos e quentão.

Quando questionado sobre os sonhos para o futuro do Bar do Alemão, os olhos de Antônio brilham. “Ainda quero buscar uma comida que seja só o Alemão que tem. Não sei o que é. Se eu soubesse, eu já tinha feito”, brinca.

As 23h40, o Bar do Alemão encerra o expediente e inicia a limpeza da calçada. Foto: Gabriele Oliveira

As 23h40, o Bar do Alemão encerra o expediente e inicia a limpeza da calçada. Foto: Gabriele Oliveira

Mesas do Bar do Alemão estão sempre lotadas. Foto: Gabriele Oliveira

Mesas do Bar do Alemão estão sempre lotadas. Foto: Gabriele Oliveira

Bar do Alemão funciona de segunda a sábado, das 17h as 23h40. Foto: Gabriele Oliveira

Bar do Alemão funciona de segunda a sábado, das 17h as 23h40. Foto: Gabriele Oliveira

Antônio Salum, o Alemão. Foto: Gabriele Oliveira

Antônio Salum, o Alemão. Foto: Gabriele Oliveira

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Mesas do Bar do Alemão estão sempre lotadas. Foto: Gabriele Oliveira

Mesas do Bar do Alemão estão sempre lotadas. Foto: Gabriele Oliveira

Bar do Alemão funciona de segunda a sábado, das 17h as 23h40. Foto: Gabriele Oliveira

Bar do Alemão funciona de segunda a sábado, das 17h as 23h40. Foto: Gabriele Oliveira

Antônio Salum, o Alemão. Foto: Gabriele Oliveira

Antônio Salum, o Alemão. Foto: Gabriele Oliveira

La Kahlo Bodega

Espaço de acolhimento e feminismo.

Foto: Gabriele Oliveira

Foto: Gabriele Oliveira

Quando chegou à Avenida Hercílio Luz, em 2017, a bodega La Kahlo encontrou resistência.

Localizado ao lado do Rio's Bar, que carrega quarenta anos de história, e próximo ao Bar do Alemão, ambos com público majoritariamente masculino, Juliana e Chayane tiveram que lutar para que seu espaço fosse respeitado. 

Sendo o primeiro bar com foco no acolhimento de mulheres e pessoas LGBTQIA+ da região, criar um ambiente seguro para esse público foi um desafio. 

“No começo tinha muito preconceito, muitos homens vindo aqui encher o saco de mulheres, dando em cima das manas trans também. Não tinha respeito da população, de entender que aqui era um bar pra mulheres e LGBTQIA+”, relembra Juliana.

A disputa pelo espaço, além de físico, também é simbólica na escolha do nome: uma homenagem a Frida Kahlo,  pintora mexicana conhecida pelos seus retratos, autorretratos, e obras inspiradas na natureza e artefatos do México. 

Ao invés de bar, La Kahlo é uma bodega, um termo já pouco utilizado, escolhido politicamente para que o local fosse tratado no feminino.  

O desejo de criar um espaço de acolhimento e trocas veio de experiências pessoais de Juliana, que já trabalhou em ONGs e centros de referência para mulheres em situação de violência. 

Hoje já consolidado e sendo referência na região central, a bodega feminista e LGBTQIA+ esta aberto de terça a sabado, das 14h as 22h. No cardápio, drinks autorais que homenageiam mulheres de grande importância histórica, como Elza Soares, Dona Onete, Marsha P. Johnson e Lélia Gonzales, além da própria Frida Kahlo. 

Além da venda de bebidas, a La Kahlo se propõe a ser um espaço cultural, promovendo debates, exposições, eventos, oficinas, performances, palestras e lançamento de livros. Para o futuro, Juliana sonha em ampliar o espaço, para acolher ainda mais pessoas. E segue lutando para que corpos de mulheres, gays, lésbicas, bissexuais e trans não voltem a ser limitados aos guetos.

“Antes eu tinha medo de caminhar no centro à noite. A gente reocupou, tá existindo e resistindo. Como mulheres e LGBTQIA+, buscando ter um espaço mais seguro. Nós vamos ocupar esse espaço.”

Aviso na entrada da bodega. Foto: Gabriele Oliveira

Aviso na entrada da bodega. Foto: Gabriele Oliveira

Bodega tem como publico alvo pessoas LGBTQIA+. Foto: Gabriele Oliveira.

Bodega tem como publico alvo pessoas LGBTQIA+. Foto: Gabriele Oliveira.

Pintura de Frida Kahlo ocupa toda a parede do bar. Foto: Gabriele Oliveira

Pintura de Frida Kahlo ocupa toda a parede do bar. Foto: Gabriele Oliveira

Elementos feministas fazem parte da decoração. Foto: Gabriele Oliveira

Elementos feministas fazem parte da decoração. Foto: Gabriele Oliveira

Juliana, uma das proprietárias da La Kahlo Bodega. Foto: Gabriele Oliveira

Juliana, uma das proprietárias da La Kahlo Bodega. Foto: Gabriele Oliveira

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Pintura de Frida Kahlo ocupa toda a parede do bar. Foto: Gabriele Oliveira

Pintura de Frida Kahlo ocupa toda a parede do bar. Foto: Gabriele Oliveira

Elementos feministas fazem parte da decoração. Foto: Gabriele Oliveira

Elementos feministas fazem parte da decoração. Foto: Gabriele Oliveira

Juliana, uma das proprietárias da La Kahlo Bodega. Foto: Gabriele Oliveira

Juliana, uma das proprietárias da La Kahlo Bodega. Foto: Gabriele Oliveira

Dona Jovem

Cerveja gelada e comida boa.

Foto: Gabriele Oliveira.

Foto: Gabriele Oliveira.

Em frente a bodega La Kahlo e o tradicional Rio’s Bar, está o Dona Jovem.

Um bar pequeno, aconchegante, com mesas internas e externas, leds coloridos e um misto de estampas e desenhos nas paredes.

Funcionando de terça a sábado, das 18h à 00h, o Dona Jovem é de tudo um pouco. Seu público alvo? Todo mundo.  

O clima de casa de vó não é acidental. O nome do bar é homenagem a Dona Jovelina, avó de Thais Sanches, que junto da esposa Beatriz Resende e da sogra Clarice Resende, é proprietária do local. 

Tais é formada em gastronomia, e a culinária é ponto forte do local. Drinks, porções e pastéis para todos os gostos. O Dona Jovem, inclusive, surgiu primeiro como restaurante. Pela demanda do público, o trio ampliou a venda de bebidas. Ao longo dos 18 meses de vida, a cerveja foi aos poucos tomando mais espaço no estoque. 

“Levamos os dois por um tempo, mas não deu. Florianópolis? Hercílio Luz? É bar”, brinca Thais, que hoje faz parte da maré de reocupação da avenida que já foi fantasma.

Geograficamente localizado entre os extremos Bar do Alemão e Madalena, no Dona Jovem é possível encontrar frequentadores de todos os tipos. O tiozão de chinelo sentado tomando cerveja, as múltiplas famílias analisando o cardápio, jovens estilosos programando o after e o público LGBTQIA+ que se reúne nas mesas formam um contraste que para Thais, é belo. 

“É uma casa de vó. A ideia é que todo mundo venha, encha a barriga e saia feliz. Todo mundo vem e é aceito, independente de quem seja – o que deveria acontecer em qualquer lugar. Não deveria ter distinção nenhuma. Acho que os lugares não deveriam nem ter um público alvo.”

A diversidade está representada no banheiro do bar: uma placa escrito Tanto Faz, com o desenho de um centauro e uma sereia, sinaliza que o local é agênero. Todos compartilham o mesmo banheiro, assim como é na casa de vó. 

Apesar dos desafios da gestão financeira e administrativa do local, as três donas estão orgulhosas do que construíram – com apoio de outros bares, como Thais ressalta. 

Orgulhosas, mas não satisfeitas. Para o futuro, querem expandir o espaço, construir um novo banheiro, ter um cardápio novo e maior, uma decoração única e mais uma longa lista de sonhos a serem conquistados. Sonhos não só para seu espaço, mas para todo o seu redor. 

“O que o jovem tem que fazer é ocupar a rua mesmo, cada vez mais. Vai fazer o que? Se pedir pro jovem não vir mais pro centro, ele vai pra onde? Cê vai só transferir ele pra outra rua. Você só muda a fiscalização de lugar. O que chamam de problema – que nem é um problema – só vai mudar de endereço. Que venham mais bares! Traz mais gente. Tem público pra todo mundo.”

O aconchego do Dona Jovem! Foto: Gabriele Oliveira

O aconchego do Dona Jovem! Foto: Gabriele Oliveira

O aconchegante Dona Jovem. Foto: Gabriele Oliveira

O aconchegante Dona Jovem. Foto: Gabriele Oliveira

Thais, uma das proprietárias do Dona Jovem. Foto: Gabriele Oliveira

Thais, uma das proprietárias do Dona Jovem. Foto: Gabriele Oliveira

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O aconchegante Dona Jovem. Foto: Gabriele Oliveira

O aconchegante Dona Jovem. Foto: Gabriele Oliveira

Thais, uma das proprietárias do Dona Jovem. Foto: Gabriele Oliveira

Thais, uma das proprietárias do Dona Jovem. Foto: Gabriele Oliveira

Madalena

Meio bar, meio rua.

O bar

Foto: Gabriele Oliveira

Foto: Gabriele Oliveira

Brilho, neon, glitter. Corpos dançando, riso alto e contato humano. O ambiente do Madalena Bar é envolvente, cheio de energias.

Lá dentro, o tempo parece funcionar de uma maneira diferente. E talvez, pelo impacto que causou na ilha, o tempo tenha sido alterado aqui fora também.

O Madalena Bar, criado pelo casal Rose Bär e Anna O’Sfair, surgiu em 2018. Mas, sua presença é tão marcante, que os quatro anos parecem quarenta. Para a maior parte dos jovens de Floripa e região, é difícil lembrar da vida noturna no centro antes do Madalena.

O nome forte, referência a uma figura histórica injustiçada, foi escolhido para ser lembrado. E funcionou. Só que manezinho gosta de encurtar as palavras, e o Madalena virou Mada. 

Localizado na Rua Victor Meirelles, ao lado da Avenida Hercílio Luz, o Mada funciona de quarta a sábado, das 19h às 2h. Sua proposta é acolher pessoas LGTBQIA+ e mulheres – que integram a sigla, ou não. 

Devido a falta de espaço nos estoques e cozinha, no local não há venda de comida. O foco é a coquetelaria de qualidade, com drinks autorais, exclusivos, e ricos em detalhes. Como o Sapatônica: gin tônica e licor de tangerina. No topo, dois gomos de tangerina, uma pimenta rosa e um alecrim, formando uma vulva. 

Não só nos copos: toda a estrutura é rica em detalhes que trazem referências da história de Anna e Rose, formando uma estética única. Além das festas e bailes temáticos, a exposição de filmes também integra a agenda.

Apesar de ter mais de uma década de experiência em comércios noturnos, Rose segue enfrentando os desafios de lutar para que a noite também seja um espaço seguro. No bolso, pesam os constantes aumentos de preço, que não podem ser repassados para o consumidor.

“Se a gente for repassar todos os aumentos que tem nos produtos pro cliente, aumentaria tudo, toda semana. Nesses quatro anos, a gente aumentou o valor do cardápio uma vez, neste ano. Porque a gente sabe o quão é difícil também pras pessoas”, explica.

A falta de apoio do poder público também é um desafio constante. Durante a pandemia, o Mada ficou fechado por mais de um ano – não houve renegociação de aluguel ou isenção dos impostos. 

Nos olhos cansados de Rose, brilham sonhos atrapalhados pela pandemia: a criação do Festival Madalena, um espaço de arte, cultura, performances e atrações musicais, a expansão do espaço do bar, possibilitando o funcionamento de uma cozinha.

Os drinks do Madalena são conhecidos por toda a ilha. Foto: Gabriele Oliveira

Os drinks do Madalena são conhecidos por toda a ilha. Foto: Gabriele Oliveira

Morgana Victoria-Regia, na festa TupiniQueens, em 08/07/2022. Vídeo: Gabriele Oliveira

Morgana Victoria-Regia, na festa TupiniQueens, em 08/07/2022. Vídeo: Gabriele Oliveira

Primeiro andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Primeiro andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Primeiro andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Primeiro andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Rosa Bür e Anna O'Sfair, proprietárias do Madalena Bar. Foto: Acervo pessoal.

Rosa Bür e Anna O'Sfair, proprietárias do Madalena Bar. Foto: Acervo pessoal.

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Primeiro andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Primeiro andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Primeiro andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Primeiro andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo andar do Madalena. Foto: Arquivo pessoal.

Rosa Bür e Anna O'Sfair, proprietárias do Madalena Bar. Foto: Acervo pessoal.

Rosa Bür e Anna O'Sfair, proprietárias do Madalena Bar. Foto: Acervo pessoal.

Madalena

Meio bar, meio rua

A rua

Foto: Gabriele Oliveira

Foto: Gabriele Oliveira

No dia 11 de outubro de 2018, com a inauguração do Madalena Bar, surgiu um movimento de ocupação da rua Victor Meirelles.

De forma espontânea, jovens se aglomeram na rua, compartilhando bebidas, cigarros, músicas e histórias. Há quatro anos, este encontro se repete.

Sem autorização das proprietárias, o movimento urbano pegou emprestado o nome do bar: nascia ali um segundo Madalena, autônomo, rebelde, símbolo de resistência da juventude de uma cidade onde o lazer é privilégio – e custa caro.

A repressão veio, e de forma extremamente violenta. No carnaval de 2019, a polícia militar utilizou bombas de gás e tiros de bala de borracha para dispersar o público nas ruas Victor Meirelles e Avenida Paulo Fontes, deixando diversas pessoas feridas. 

Nos últimos meses, as ruas do centro se tornaram palco de mais uma série de “casos isolados” de truculência policial. Os comerciantes locais também sofrem com a perseguição: com o horário de trabalho reduzido por ordem do Ministério Público, não há como ter lucro.  

“Quando houve essa regulamentação em 2019, por causa dos bailes na rua, diminuíram o horário dos bares. Mas o nosso foco é interno. É diferente de quem tem bar e atende na rua, que tem movimento desde às 18h. O nosso movimento principal é às 22h. Se fecha à 00h, meu faturamento cai mais de 50%”, explica Rose Bür.

Para Rose, é importante que as regras sejam cumpridas, para que a vida noturna se mantenha segura. Porém, as decisões são tomadas de maneira unilateral pelas instituições públicas, sem diálogo com os comerciantes e frequentadores dos bares e ruas. 

Não há representações para estes públicos na câmara municipal, restringindo o debate sobre a reocupação do centro ao dois segmentos: moradores dos prédios de alto custo da região e a polícia militar. 

“A gente entende que tem lei, e os espaços precisam seguir essas leis. Porém, a maneira como eles escolheram pra fazer com que isso não acontecesse, foi equivocada, porque foi violenta. Foi criminalizando a ocupação, desumanizando quem frequenta”.   

Apesar dos pontos negativos da confusão entre o que é bar e o que é rua, Rosa deseja que o movimento continue crescendo e resistindo, desde que não descumpra a lei. 

Com caixas de som, cigarros de todos os tipos, garrafas de bebida e muita determinação, a juventude de Florianópolis resiste e continua se encontrando, semanalmente, no Madalena-Rua.

Abaixo, confira no mapa os bares da região da Avenida Hercílio Luz, conhecida como centro-baixo:

A ocupação na rua Victor Meirelles ficou popularmente conhecida como Madalena, nome de um dos bares do local. Foto: Gabriele Oliveira

A ocupação na rua Victor Meirelles ficou popularmente conhecida como Madalena, nome de um dos bares do local. Foto: Gabriele Oliveira

No local, diversos avisos nas paredes chamam atenção para o lixo gerado pelos frequentadores. Foto: Gabriele Oliveira

No local, diversos avisos nas paredes chamam atenção para o lixo gerado pelos frequentadores. Foto: Gabriele Oliveira

Celebrando amores e amizades, jovens se reúnem do Madalena-Rua todas as sextas e sábados. Foto: Gabriele Oliveira

Celebrando amores e amizades, jovens se reúnem do Madalena-Rua todas as sextas e sábados. Foto: Gabriele Oliveira

Entre 2h e 3h, a Policia chega ao local para dispersar a multidão. Vídeo: Gabriele Oliveira

Entre 2h e 3h, a Policia chega ao local para dispersar a multidão. Vídeo: Gabriele Oliveira

Após dispersão e limpeza da rua, o movimento noturno do centro se encerra. Foto: Gabriele Oliveira

Após dispersão e limpeza da rua, o movimento noturno do centro se encerra. Foto: Gabriele Oliveira

Apesar dos conflitos com a PM, jovens seguem ocupando o local semanalmente. Foto: Gabriele Oliveira

Apesar dos conflitos com a PM, jovens seguem ocupando o local semanalmente. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: No Class. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: No Class. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Desgosto, no antigo bar Treze. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Desgosto, no antigo bar Treze. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Travessa do Samba. Foto: Gabriele Oliveira.

Outros bares do centro-baixo: Travessa do Samba. Foto: Gabriele Oliveira.

Outros bares do centro-baixo: Fala Marquinho, um fast-bar. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Fala Marquinho, um fast-bar. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Haôma, e ao lado, o Selva. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Haôma, e ao lado, o Selva. Foto: Gabriele Oliveira

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Outros bares do centro-baixo: No Class. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: No Class. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Desgosto, no antigo bar Treze. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Desgosto, no antigo bar Treze. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Travessa do Samba. Foto: Gabriele Oliveira.

Outros bares do centro-baixo: Travessa do Samba. Foto: Gabriele Oliveira.

Outros bares do centro-baixo: Fala Marquinho, um fast-bar. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Fala Marquinho, um fast-bar. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Haôma, e ao lado, o Selva. Foto: Gabriele Oliveira

Outros bares do centro-baixo: Haôma, e ao lado, o Selva. Foto: Gabriele Oliveira