QUEM É ACOSTUMADO A TRABALHAR NÃO SE APOSENTA?

À própria sorte, idosos trabalham informalmente
no Centro de Florianópolis

Fotos: Gabriel Padilha

Fotos: Gabriel Padilha

Amarelo é a cor da sorte.

E amarelo colore a casa da Sociedade Musical Filarmônica Comercial que compõe a esquina da Rua Bento Gonçalves com o calçadão da Rua Conselheiro Mafra, onde o casal Gomercino Amaral da Silva, 56, e Zoraide Simplício da Silva, 61, vestidos com a cor do losango da bandeira do Brasil montam uma pequena mesa sob um guarda-sol que os protege dos raios do astro de mesma cor. Na mesinha está espalhada a sorte, que em números é vendida a pessoas que circulam pelo Centro de Florianópolis.

O casal Gomercino e Zoraide vende Trimania no Centro de Florianópolis, cidade em que moram há mais de 30 anos. Foto: Gabriel Philippi

O casal Gomercino e Zoraide vende Trimania no Centro de Florianópolis, cidade em que moram há mais de 30 anos. Foto: Gabriel Philippi

Faltando pouco para se aposentar, Gomercino faz planos e comenta: “quem é acostumado a trabalhar não se aposenta”. Ele conta que a popularização da venda de títulos de capitalização nas ruas é a chance de aposentados complementarem a renda, e para ele a banda toca no mesmo ritmo. Não restam dúvidas que, mesmo aposentado, continuará a trabalhar sem carteira assinada na rua, onde gosta de estar.

Relegados à própria sorte, o número de pessoas acima de 60 anos desocupadas mais do que triplicou entre 2012 e 2021, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua. No primeiro trimestre de 2022, esta população representou 301 mil pessoas na terceira idade que estão desempregadas, mas buscam trabalho. 

O mercado informal, onde os trabalhadores não possuem carteira assinada, é uma das alternativas para o grupo de pessoas acima de 60 anos que procuram emprego. Entre 2020 e 2021, o número de idosos no setor privado e sem carteira assinada cresceu 21%, enquanto aqueles que trabalham por conta própria aumentou em 12%. 

A crescente informalidade está inserida em um contexto que aponta diversas origens, conforme Thaís de Souza Lapa, coordenadora do Laboratório de Sociologia do Trabalho (LASTRO) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). “Desde 2012, nós tivemos uma série de transformações no mercado de trabalho brasileiro que alteraram a dinâmica de mercado e as proteções previstas para a população de modo geral. E a partir de 2014, tivemos crise econômica, instabilidade política e uma série de aprovação de medidas em um contexto, que muitos autores definem como de realinhamento e aprofundamento neoliberal e que tornam desfavorável o acesso ao emprego de forma geral e, principalmente, o emprego protegido”.

Nascido em Lages (SC), Gomercino trabalhou na construção civil e, por último, na venda de jornais impressos desde que se mudou para a capital catarinense. Em alguns momentos conciliou a comercialização de bilhetes premiáveis com a venda de noticiários físicos. Porém, com a digitalização das informações, ele deixou de lado as letras e decidiu comercializar apenas os números da sorte.

Mesmo antes de chegar à terceira idade, Gomercino sofreu com os impactos de mudanças no mundo do trabalho como o avanço de tecnologias, necessidade de qualificações, entre outros obstáculos que impedem a ocupação de postos formais de trabalho ou recolocações a partir dos 40 anos de idade. Com isso, ele e Zoraide veem a Trimania como uma oportunidade e trabalham com ela há mais de 15 anos.

Nascido em Lages (SC), Gomercino trabalhou na construção civil e, por último, na venda de jornais impressos desde que se mudou para a capital catarinense. Em alguns momentos conciliou a comercialização de bilhetes premiáveis com a venda de noticiários físicos. Porém, com a digitalização das informações, ele deixou de lado as letras e decidiu comercializar apenas os números da sorte. 

Mesmo antes de chegar à terceira idade, Gomercino sofreu com os impactos de mudanças no mundo do trabalho como o avanço de tecnologias, necessidade de qualificações, entre outros obstáculos que impedem a ocupação de postos formais de trabalho ou recolocações a partir dos 40 anos de idade. Com isso, ele e Zoraide veem a Trimania como uma oportunidade e trabalham com ela há mais de 15 anos.

Thaís Lapa, destaca que existem uma série de segregações dentro do mercado de trabalho que não possuem uma razão técnica para o exercício da atividade. “A lógica da descartabilidade humana impera no mercado de trabalho, onde a pessoa envelheceu ou adoeceu e é descartada por razões muito mais operacionais, no sentido econômico, do que da qualidade do que ela faz”.

"A pessoa envelheceu ou adoeceu e é descartada por razões muito mais operacionais, no sentido econômico"

A faixa etária entre 40 e 59 anos também foi afetada pela pandemia, conforme apontam os dados da PNAD Contínua entre janeiro e outubro de 2020, quando o número de pessoas desocupadas nestas idades saltou de mais de 2,8 milhões para cerca de 3,6 milhões. 

Com base em experiências de pesquisas no primeiro ano de pandemia, Thaís aponta aspectos que influenciaram nestes indicadores. “A reforma trabalhista aprovada em 2017 abriu uma série de medidas que, entre outras, facilitava demissões que empregadores quisessem realizar e flexibilizava vários mecanismos, assim como, rebaixava proteções e direitos”.

O crescimento no número de pessoas na terceira idade ou de faixa etária próxima  ainda de forma ativa em busca de trabalho ou em postos informais também está relacionado ao envelhecimento da população brasileira que ocorre de forma acelerada. De acordo com projeções do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2010 os idosos representavam 7,3%, enquanto em 2100 podem chegar a 40,3% da população no país. A dinâmica populacional interfere na sustentabilidade do sistema previdenciário do país e, consequentemente, na forma como as pessoas contribuem ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para conseguir a aposentadoria. 

Em 13 de novembro de 2019, entrou em vigor a Reforma da Previdência, que altera regras para se aposentar, em que mulheres precisam ter pelo menos 62 anos de idade e 15 anos de contribuição, e para os homens o tempo de contribuição é de 20 anos e a idade mínima é de 65. 

Sobre a definição de uma idade mínima para aposentadoria, a pesquisadora do LASTRO apresenta preocupação. “Ela aumenta a distância entre o tempo de exercício de trabalho e o tempo de descanso para a pessoa usufruir da sua velhice. Nesta perspectiva, um jargão entre intelectuais e movimentos sociais fala que as pessoas terão de trabalhar até morrer, e isso é uma situação bem cruel e com pouca atenção pelo poder público, ainda mais no momento em que o país voltou ao mapa da fome. Neste contexto, nenhuma das saídas que garantam dignidade e sobrevivência a partir de emprego, renda ou políticas estão sendo acionadas para minimizar o problema”, afirma.

LACY

Na esquina do calçadão da Felipe Schmidt com a Rua Trajano, próximo ao antigo café Senadinho, mas longe dos locais e das pessoas que decidem com quantos anos ela pode se aposentar, Lacy da Silva Nenhaus, 61 anos, monta sua mesa com o guarda-sol amarelo para receber os clientes e vender papéis que podem garantir prêmios.

Na esquina do calçadão da Felipe Schmidt com a Rua Trajano, próximo ao antigo café Senadinho, mas longe dos locais e das pessoas que decidem com quantos anos ela pode se aposentar, Lacy da Silva Nenhaus, 61 anos, monta sua mesa com o guarda-sol amarelo para receber os clientes e vender papéis que podem garantir prêmios.

“Aí, não acredito.
Eram os bilhetes da sorte”.

Com uma risada divertida, Lacy encolhe os ombros em sinal de quem não poderia fazer nada. Ela informa a sua cliente que, infelizmente, alguém comprou as últimas folhas da cartela com número final 86. No entanto, Lacy a tranquiliza, anotando o número da sorte com uma caneta na mão, garantindo que para o próximo sábado guardaria o ‘86’ especialmente para a sua mais nova cliente.

A cacofonia de “boa sorte!”, “o troco” e “vamos ganhar o prêmio” ecoa pela rua Felipe Schmidt, número 80, no Centro de Florianópolis, bem em frente a joalheria Schmidt Pedras. Enquanto a vendedora da Trimania trabalha, debaixo de um pequeno guarda-sol, sentada em um banco de plástico, ela confere o troco, assina cartelas e conversa animada com todas as pessoas que param diante dela, em busca da sorte grande. 

Lacy trabalha de segunda à sexta-feira das 9h às 18h e aos sábados das 9h às 13h como vendedora da Trimania, desde 2017. Para ela, o trabalho é gratificante, pois pode conversar com as pessoas e ainda ajudá-las a realizarem seus sonhos. Na rua Felipe Schmidt, ela está há pouco tempo, cerca de dois meses. O local, que fica na esquina com a Rua Trajano, bem próximo ao McDonald 's da região, está sendo um ponto de sucesso. Além do grande movimento, que favorece as vendas, em pouco mais de um mês, a vendedora já entregou dois prêmios. Algo que é bom para seus clientes e também para ela. 

Cada folha da Trimania rende ao vendedor R$ 1,20, como cada cartela possui 300 folhas, o valor máximo que um vendedor consegue tirar, por cartela, é de R$ 360. É nesse cálculo que entra a importância dos prêmios, pois quem vende os números premiados, também recebe uma comissão. “Quando entrego um prêmio grande, tipo de R$ 100 mil, R$ 200 mil, a gente ganha uma comissão de R$ 1000. Quando é um prêmio de mil, um giro da sorte, ganha R$100”. A comissão funciona como um bônus inesperado, que serve de incentivo aos vendedores. Quem vê o vendedor da Trimania entregando prêmios, costuma comprar sempre no mesmo lugar.

Durante os anos de 1996 a 2004, ela foi dona de uma empresa de confecção de calçados, que carregava seu nome. Depois trabalhou no Angeloni como gerente de loja, no banco Itaú, então outra vez no Angeloni como caixa de supermercado, onde ficou por quase dez anos. Na Trimania desde 2017, Lacy da Silva Nenhaus, vislumbra sua aposentadoria. Pelas contas que faz, com os dedos querendo se certificar das datas exatas, já possui entre 18 a 19 anos de contribuição. Por isso, ao completar 62 anos de idade, no dia 13 de julho, estará apta a se aposentar. Ainda assim, não pretende parar de vender Trimania. Não sabe exatamente quanto irá receber de aposentadoria, por isso o dinheiro do emprego servirá de segunda renda. Mais uma renda e entregando prêmio.

Mãe de três filhos, ela comenta que o que recebe durante o mês vendendo paga as contas da casa, mas não sobra nada para si, ou para ajudar os filhos. Além do guarda-sol, o cartaz da Trimania e o banco que utiliza para sentar durante o período de trabalho, todo o restante fica por conta da vendedora. O transporte, alimentação durante o serviço e até as canetas saem do seu bolso, precisando de um bom planejamento para não gastar mais do que recebe durante o dia. 

A coordenadora do LASTRO, Thaís, argumenta que a forma como os empregadores enxergam os idosos favorece a permanência deles em empregos desprotegidos; com condições inadequadas de trabalho. A situação econômica impõe uma noção de renda extra por necessidade, sentimento que cresce na população desde o anúncio da reforma da Previdência e que se agravou com a pandemia. Por outro lado, Thaís também afirma que continuar trabalhando, mesmo aposentado, para muitos idosos é uma questão de dignidade pessoal. “É adoecedor ficar em casa, depois de uma vida inteira trabalhando fora”, comentou a coordenadora.

Dessa forma, após um dia inteiro de trabalho, Lacy mantém o sorriso no rosto e reforça o quão gratificante é, para ela, trabalhar no Centro de Florianópolis. Após o expediente, a idosa conta com a boa vontade dos vendedores da região para armazenar o guarda-sol e mesa, evitando o desgaste de trazer o material todos os dias. Atualmente, é no Bazar das Chaves e Carimbos, localizado também na Felipe Schmidt nº80, onde os objetos de trabalho ficam preservados.

“Aí, não acredito.
Eram os bilhetes da sorte”.

Com uma risada divertida, Lacy encolhe os ombros em sinal de quem não poderia fazer nada. Ela informa a sua cliente que, infelizmente, alguém comprou as últimas folhas da cartela com número final 86. No entanto, Lacy a tranquiliza, anotando o número da sorte com uma caneta na mão, garantindo que para o próximo sábado guardaria o ‘86’ especialmente para a sua mais nova cliente.

A cacofonia de “boa sorte!”, “o troco” e “vamos ganhar o prêmio” ecoa pela rua Felipe Schmidt, número 80, no Centro de Florianópolis, bem em frente a joalheria Schmidt Pedras. Enquanto a vendedora da Trimania trabalha, debaixo de um pequeno guarda-sol, sentada em um banco de plástico, ela confere o troco, assina cartelas e conversa animada com todas as pessoas que param diante dela, em busca da sorte grande. 

Lacy trabalha de segunda à sexta-feira das 9h às 18h e aos sábados das 9h às 13h como vendedora da Trimania, desde 2017. Para ela, o trabalho é gratificante, pois pode conversar com as pessoas e ainda ajudá-las a realizarem seus sonhos. Na rua Felipe Schmidt, ela está há pouco tempo, cerca de dois meses. O local, que fica na esquina com a Rua Trajano, bem próximo ao McDonald 's da região, está sendo um ponto de sucesso. Além do grande movimento, que favorece as vendas, em pouco mais de um mês, a vendedora já entregou dois prêmios. Algo que é bom para seus clientes e também para ela. 

Cada folha da Trimania rende ao vendedor R$ 1,20, como cada cartela possui 300 folhas, o valor máximo que um vendedor consegue tirar, por cartela, é de R$ 360. É nesse cálculo que entra a importância dos prêmios, pois quem vende os números premiados, também recebe uma comissão. “Quando entrego um prêmio grande, tipo de R$ 100 mil, R$ 200 mil, a gente ganha uma comissão de R$ 1000. Quando é um prêmio de mil, um giro da sorte, ganha R$100”. A comissão funciona como um bônus inesperado, que serve de incentivo aos vendedores. Quem vê o vendedor da Trimania entregando prêmios, costuma comprar sempre no mesmo lugar.

Durante os anos de 1996 a 2004, ela foi dona de uma empresa de confecção de calçados, que carregava seu nome. Depois trabalhou no Angeloni como gerente de loja, no banco Itaú, então outra vez no Angeloni como caixa de supermercado, onde ficou por quase dez anos. Na Trimania desde 2017, Lacy da Silva Nenhaus, vislumbra sua aposentadoria. Pelas contas que faz, com os dedos querendo se certificar das datas exatas, já possui entre 18 a 19 anos de contribuição. Por isso, ao completar 62 anos de idade, no dia 13 de julho, estará apta a se aposentar. Ainda assim, não pretende parar de vender Trimania. Não sabe exatamente quanto irá receber de aposentadoria, por isso o dinheiro do emprego servirá de segunda renda. Mais uma renda e entregando prêmio.

Mãe de três filhos, ela comenta que o que recebe durante o mês vendendo paga as contas da casa, mas não sobra nada para si, ou para ajudar os filhos. Além do guarda-sol, o cartaz da Trimania e o banco que utiliza para sentar durante o período de trabalho, todo o restante fica por conta da vendedora. O transporte, alimentação durante o serviço e até as canetas saem do seu bolso, precisando de um bom planejamento para não gastar mais do que recebe durante o dia. 

A coordenadora do LASTRO, Thaís, argumenta que a forma como os empregadores enxergam os idosos favorece a permanência deles em empregos desprotegidos; com condições inadequadas de trabalho. A situação econômica impõe uma noção de renda extra por necessidade, sentimento que cresce na população desde o anúncio da reforma da Previdência e que se agravou com a pandemia. Por outro lado, Thaís também afirma que continuar trabalhando, mesmo aposentado, para muitos idosos é uma questão de dignidade pessoal. “É adoecedor ficar em casa, depois de uma vida inteira trabalhando fora”, comentou a coordenadora.

Dessa forma, após um dia inteiro de trabalho, Lacy mantém o sorriso no rosto e reforça o quão gratificante é, para ela, trabalhar no Centro de Florianópolis. Após o expediente, a idosa conta com a boa vontade dos vendedores da região para armazenar o guarda-sol e mesa, evitando o desgaste de trazer o material todos os dias. Atualmente, é no Bazar das Chaves e Carimbos, localizado também na Felipe Schmidt nº80, onde os objetos de trabalho ficam preservados. 

ANA

Quem também conta com a boa vontade dos lojistas é Ana Vieira, de 70 anos, que vende panos na Rua Conselheiro Mafra, número 388 desde 2018. Para evitar carregar todos os dias as grandes sacolas repletas com os panos, ela guarda seus produtos na galeria de lojas que fica ao lado do local onde trabalha.

Acostumada a trabalhar desde os 16 anos, Ana passou boa parte da vida trabalhando como cozinheira na região do Estreito. Ela se aposentou aos 49 anos, em 2001, mas não ficou sem trabalhar por muito tempo. Eu tava muito parada em casa e não dá pra ficar muito parada em casa, porque vai apertando né”. Assim como relatou Lacy, Ana gosta de trabalhar no Centro, e entre a venda de um pano e outro, faz tricô e conversa com as outras pessoas que trabalham na rua próximo à ela. 

"Não dá pra ficar muito parada
em casa, porque vai apertando”

Para Ana, é impossível sobreviver somente com o dinheiro da aposentadoria e a decisão foi tomada por necessidade. Ana relata que não precisou de muito para começar a vender os panos, apenas o alvará da prefeitura que conseguiu com facilidade e sem precisar de muitas informações. Eu tô aqui faz mais de três anos, fui na prefeitura, peguei a licença e comecei a trabalhar.

A pesquisadora do LASTRO, Thaís, reforça que os patamares de direitos para o mercado de trabalho no Brasil são baixos. Boa parte desses direitos é negado e a maior parte da classe trabalhadora é explorada, continuamente, durante a vida. Assim, a maioria das pessoas não consegue discernir o que seriam boas condições de trabalho, e quais as contrapartidas do Estado, ou dos empregadores, para garantir tais direitos. Sem pensar em nada disso, Ana Vieira segue trabalhando e mesmo com 70 anos, não pensa em parar.

O comércio na rua é bom e todos os meses precisava viajar até Brusque, para conseguir mais pano para vender. Por outro lado, viajar é o que mais gosta de fazer e sempre que pode, além de Brusque também visita a cidade de Aparecida do Norte. Enquanto conseguir, pretende continuar assim. Mesmo que bem na frente de onde trabalha de segunda a sábado, uma loja da Central do Pano esteja em construção, Ana diz não estar preocupada, pois acha que não afetará seu trabalho. Caso precise, está disposta a encontrar outro lugar.

Quem também conta com a boa vontade dos lojistas é Ana Vieira, de 70 anos, que vende panos na Rua Conselheiro Mafra, número 388 desde 2018. Para evitar carregar todos os dias as grandes sacolas repletas com os panos, ela guarda seus produtos na galeria de lojas que fica ao lado do local onde trabalha.

Acostumada a trabalhar desde os 16 anos, Ana passou boa parte da vida trabalhando como cozinheira na região do Estreito. Ela se aposentou aos 49 anos, em 2001, mas não ficou sem trabalhar por muito tempo. Eu tava muito parada em casa e não dá pra ficar muito parada em casa, porque vai apertando né”. Assim como relatou Lacy, Ana gosta de trabalhar no Centro, e entre a venda de um pano e outro, faz tricô e conversa com as outras pessoas que trabalham na rua próximo à ela. 

"Não dá pra ficar muito parada
em casa, porque vai apertando”

Para Ana, é impossível sobreviver somente com o dinheiro da aposentadoria e a decisão foi tomada por necessidade. Ana relata que não precisou de muito para começar a vender os panos, apenas o alvará da prefeitura que conseguiu com facilidade e sem precisar de muitas informações. Eu tô aqui faz mais de três anos, fui na prefeitura, peguei a licença e comecei a trabalhar.

A pesquisadora do LASTRO, Thaís, reforça que os patamares de direitos para o mercado de trabalho no Brasil são baixos. Boa parte desses direitos é negado e a maior parte da classe trabalhadora é explorada, continuamente, durante a vida. Assim, a maioria das pessoas não consegue discernir o que seriam boas condições de trabalho, e quais as contrapartidas do Estado, ou dos empregadores, para garantir tais direitos. 

Sem pensar em nada disso, Ana Vieira segue trabalhando e mesmo com 70 anos, não pensa em parar.

O comércio na rua é bom e todos os meses precisava viajar até Brusque, para conseguir mais pano para vender. Por outro lado, viajar é o que mais gosta de fazer e sempre que pode, além de Brusque também visita a cidade de Aparecida do Norte. Enquanto conseguir, pretende continuar assim. Mesmo que bem na frente de onde trabalha de segunda a sábado, uma loja da Central do Pano esteja em construção, Ana diz não estar preocupada, pois acha que não afetará seu trabalho. Caso precise, está disposta a encontrar outro lugar.