"O único lugar do mundo em que a Hellinger tem pós-graduação é o Brasil"
Como a Constelação Familiar foi incorporada por faculdades e Universidades Federais brasileiras
Determinar o que é ou não ciência nem sempre é fácil. Durante o mestrado em Direito na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), os pesquisadores Mateus França e Marina Guagliariello avaliaram a validade científica dos discursos sobre a Constelação Familiar na busca de possíveis justificativas para a aplicação do método no campo jurídico. Para começar, Mateus explica que nem todo conhecimento se propõe a ser uma ciência, ou seja, explicar como a realidade funciona através de pesquisas e métodos sistematizados. A Filosofia e a Religião são exemplos de áreas do conhecimento que não são necessariamente ciências – o que é bem diferente de ser uma pseudociência, prática ou crença que reivindica o título de ciência, mas não é compatível com o método científico.
A Constelação Familiar é reivindicada como ciência pela maioria de seus divulgadores, mas são poucos os estudos de qualidade sobre o tema, que não é consenso entre pesquisadores. No artigo “Em busca de um fundamento científico: uma análise de justificativas do uso das Constelações Familiares por agentes do campo jurídico (se houver)”, Mateus e Marina apontam diversos indícios de discursos pseudocientíficos na Constelação, como a grande importância de seu criador na validação dos conceitos, a aversão a críticas e a pretensão de funcionar para todas as áreas, em todos os casos.
A pesquisa e o ensino da prática em instituições públicas de nível superior já existem no Brasil, mas são esparsos, compostos por iniciativas isoladas. A Universidade Federal do Tocantins, por exemplo, ofereceu em 2015 duas oficinas com o tema “Direito Sistêmico: justiça curativa, soluções profundas”. Já o Núcleo de Práticas Jurídicas do curso de Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) pesquisou o Direito Sistêmico e suas aplicações em conflitos familiares em 2017. O projeto foi encerrado e o curso não tem previsão de estudar a técnica novamente, segundo a docente que coordenou o estudo.
Já na área da saúde, a Constelação Familiar ganha cada vez mais espaço em projetos de extensão nas Universidades Federais, como no Projeto Amanhecer da UFSC. Criado em 1996 “a fim de oferecer terapias complementares aos profissionais de enfermagem do Hospital Universitário”, o Projeto Amanhecer recebeu esse nome em 2004, quando se expandiu para “oferecer terapias complementares em saúde também aos servidores e comunidade acadêmica”.
Coordenadora do Amanhecer e professora do Curso de Farmácia da UFSC, Liliete Souza conta que o projeto já chegou a oferecer 47 tipos de terapias alternativas, entre atividades contempladas nas PICs e iniciativas próprias, como astrologia vocacional e bambuterapia. A professora, que também ministra as oficinas de Dança Meditativa no projeto, explica que todas as atividades são desenvolvidas de forma voluntária por professores ou outros profissionais sem vínculo com a Universidade.
O ex-empresário e constelador Lairton da Silva apresentou e inseriu as Constelações Familiares no projeto de extensão em 2011. Ele afirma que mais de 15 mil pessoas já passaram pelas Constelações do Amanhecer. A procura pelas Constelações do projeto é grande, segundo o coordenador da prática, todo semestre 30 vagas são disponibilizadas e em questão de minutos são preenchidas. Quem não consegue ficar entre os 30, também pode ir aos encontros quinzenais e participar do sorteio de vagas para não inscritos. Nas reuniões, em geral, quatro pessoas são consteladas, por aproximadamente 50 minutos cada. Os que não são chamados para constelar nem para atuar como representantes permanecem sentados, atentos e reagindo aos acontecimentos. Ora com sons que assentem o ocorrido, ora com cochichos que buscam desvendar as movimentações: “A mãe está imitando a avó!”.
No grupo, formado majoritariamente por mulheres com mais de 40 anos, está Ivanilde Dutkevicz. Em outra ocasião, ela já havia sido constelada por uma aluna em formação que participou do projeto, mas garante que com Lairton foi diferente, “muito mais impactante”. Contadora experiente, dessa vez ela buscava resolver uma questão financeira. Apesar de ter uma boa clientela, a dificuldade em cobrar pelo serviço realizado a atormentava: “Eu acabava relevando e desistindo, por serem meus amigos, mas eu percebi que eu não estava me valorizando profissionalmente”.
“O que eu fiquei mais impactada é que a minha questão financeira vem de eu estar mais ligada com o lado da minha mamãe, que é o menos abastado da família”, lembra Ivanilde. A sessão de Constelação apresentou como justificativa o fato da contadora ter tentado viver a mesma vida que a mãe, priorizando o trabalho voluntário, sem valorizar o dinheiro. Ivanilde conta que ficou chocada ao descobrir que, de acordo com a prática, o sucesso está relacionado com uma maior ligação ao lado paterno. “Eu tenho um laço forte com meu pai, então meu lado profissional está bom, mas meu lado financeiro, que é o da mãe, não”, conclui.
Até hoje, Ivanilde tenta compreender melhor seus emaranhamentos e adequar o que foi revelado na Constelação à sua realidade. Na sessão, ela foi orientada a pedir desculpas à representante de uma suposta ex-namorada de seu pai, mas não sentiu que suas palavras foram verdadeiras. Ela conta que já fez outras terapias antes – yoga, meditação, terapia holística e acupuntura –, mas a Constelação foi uma das práticas que mais a impactou.
Para a psicóloga Beatriz Coltro, psicoterapêutico é um termo que descreve as práticas profissionais dentro da Psicologia, enquanto terapêutico pode ter um sentido mais amplo no vocabulário do dia a dia. Ela explica que, em geral, é comum afirmarmos que algo é terapêutico quando aquilo nos faz bem: “Posso estar aqui tomando meu chá e dizer que chá é terapêutico para mim”.
Por isso, Beatriz acredita que se alguém passa por um processo de constelação e consegue ver a experiência como algo produtivo e que traz sentido a suas inquietações, pode entender a situação como terapêutica. O problema para ela é que, por conta das premissas da Constelação, a prática acaba beneficiando algumas pessoas em prejuízo do reconhecimento da autonomia de outras e da possibilidade de livre expressão, “sustentando alguns preconceitos e concepções sobre o ser humano restritas e que já estão ultrapassadas, inclusive pela ciências humanas e sociais”.
A psicóloga acrescenta que é preciso se perguntar, enquanto prática, “no que a constelação familiar está se sustentando para fazer o bem”. Ela exemplifica que essa sensação “terapêutica” talvez seja só a superfície de uma análise individual: "Para a Dona Maria foi bom, mas porque a Dona Maria está vivendo num sistema predominantemente machista em que a resolução de um conflito, de uma angústia, pode estar envolvida com algo muito superficial, como escutar um pedido de desculpas que ela acha que deve ouvir."
Das 68 Universidades Federais brasileiras, sete oferecem projetos de extensão de Constelação Familiar voltados à saúde e ao bem estar:
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC),
Universidade Federal de Goiás (UFG),
Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT),
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE),
Universidade Federal do Ceará (UFC),
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN),
Universidade Federal do Tocantins (UFT)
Outras três já ofereceram:
Universidade Federal do Acre (UFAC),
Universidade Federal de Jataí (UFJ) e
Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
Pós em Constelação é exclusividade brasileira
No Brasil, centenas de instituições e empresas oferecem os mais diversos tipos de cursos de Constelação Familiar, com temáticas que vão de Negócios e Administração à capacitação para atuar como terapeuta. Uma busca no Google por “cursos de Constelação Familiar” oferece mais de um milhão de resultados, incluindo múltiplos links patrocinados. A promessa de retorno financeiro é uma estratégia frequente para cativar interessados, como anuncia um curso on-line que pode ser adquirido em 12 vezes de R$ 99: “Com apenas 6 sessões de trabalho, você já pagará todo o Curso!”
O único lugar no mundo que a Hellinger tem pós-graduação é no Brasil
Quem deseja obter a formação com o selo original Hellinger, no entanto, precisa buscar os cursos exclusivos da instituição parceira da Hellinger Schule, a Faculdade Innovare. Desde 2015, a cooperativa educacional oferece as pós-graduações em Direito Sistêmico e em Constelação Familiar. “O único lugar no mundo que a Hellinger tem pós-graduação é no Brasil”, exalta Inácio Junqueira, um dos diretores da Innovare. No cadastro de Instituições de Ensino Superior do Ministério da Educação (MEC), a pós em Direito Sistêmico da faculdade aparece como uma especialização lato sensu em Gestão Pública, enquanto a de Constelação Familiar é vinculada à graduação de Gestão de Recursos Humanos.
A Innovare oferece outros cursos de diferentes áreas e durações, mas o carro-chefe são suas pós-graduações com a Hellinger Schule, que contemplam duas turmas por ano, com 100 vagas cada. Em formato híbrido e com a viúva Sophie Hellinger no corpo docente, as especializações duram 18 meses e custam cerca de R$ 32 mil, valor que pode ser dividido em até 48 vezes. O preço é similar ao de alguns dos MBAs mais prestigiados do Brasil segundo a Forbes, como o MBA Executivo em Gestão Empresarial da Faculdade Getúlio Vargas (FGV), que tem a duração de 14 meses e custa de R$ 16 a R$ 20 mil.
Inácio Junqueira conta que o que motivou a parceria foi a amizade com os Hellinger e sua própria experiência com a Constelação Familiar, que permitiu que o gestor se reconectasse com o pai, falecido há muitos anos. “Minha relação com o Bert não era uma relação de negócio, eu posso afirmar que eu não entrei nisso para ganhar dinheiro. Eu entrei porque eu vi uma coisa nova, algo que poderia mudar minha vida e realmente mudou”.
Outras faculdades pelo mundo oferecem formação acadêmica em Constelação Familiar, como a Universidade Multicultural CUDEC, instituição privada do México que abriga especializações em Pedagogia Sistêmica e Psicologia Sistêmica – que não trata da terapia sistêmica clássica da Psicologia, mas do pensamento de Bert Hellinger. O curso de Direito Sistêmico, por outro lado, é exclusividade brasileira: o próprio pensamento foi “inventado” pelo juiz baiano Sami Storch, que em 2010 começou a aplicar técnicas de Constelação Familiar em seus casos.
Formado na primeira turma de pós-graduação de Direito Sistêmico da Hellinger Schule, Lairton da Silva – constelador do Projeto Amanhecer da UFSC – também teve sua vida tocada pela Constelação Familiar. Ele conta que, apesar de bem-sucedido, não tinha um sono tranquilo. Dois anos após uma separação matrimonial, conheceu a atual esposa, que o incentivou a participar de uma sessão de Constelação.
“O homem é bem mais resistente, a mulher é mais aberta, dinâmica, procura mais, puxa o homem para frente”, afirma Lairton, ao lembrar que no início teve preconceito com a prática. Exitoso nos negócios, mas com dificuldade para finalizar coisas, ele se deu conta na Constelação que “para fechar o ralo por onde o dinheiro corria” precisava olhar para a figura paterna. “Porque é o pai que ensina a dar limite. O pai que diz não. A energia masculina e feminina são complementares. É daí que vem a nossa vida. O masculino, o pai dá limite. A mãe é mais amorosa, carinhosa.” O constelador faz uma ressalva "hoje tá mudando ,graças a Deus, o pai pode expressar mais carinho e afeto".
Assim como os pais, Lairton e os nove irmãos romperam seus casamentos. Ele diz só ter percebido como isso tinha a ver com a lei do pertencimento ao fim do seu trabalho de conclusão, de título “Separação conflituosa como vínculo”, na pós de Direito Sistêmico. “Olha como é grande a lealdade ao sistema familiar. ‘Mãe e pai, olha como a gente ama vocês, nós também nos separamos’.”
O constelador, que fez as pós-graduações de Constelação Familiar Organizacional e Direito Sistêmico da Hellinger Schule, conta que a formação é dividida entre a parte teórica e a prática. É na primeira que os livros de Bert Hellinger e alguns fundamentos da psicologia são trabalhados. Ele menciona ter estudado autores como Virginia Satir, criadora das Esculturas Familiares, e Milton Erickson, da Programação Neurolinguística (PNL), métodos que, para ele, serviram de base para as Constelações.
Com mais de dezenas de livros publicados, a maioria dos títulos de Bert Hellinger foram escritos por jornalistas. Neles, estão reunidos trechos de palestras, conversas e entrevistas. “A Simetria Oculta do Amor” foi o primeiro lançado em português pela Editora Cultrix, em 1999, um ano após a publicação original e três do livro de estreia. O título, assim como vários outros, coleciona passagens polêmicas que são frequentemente criticadas como machistas, preconceituosas e estigmatizantes.
O amor é, em geral, bem-servido quando a esposa segue o marido no seu linguajar, na sua família e cultura, e quando aceita que seus filhos o sigam também.
Essa concessão torna-se natural e boa para as mulheres se seus maridos governam no interesse do bem-estar da família e compreendem a misteriosa lei sistêmica de que o masculino serve o feminino.
Bert Hellinger. A Simetria Oculta do Amor. 1998, edição brasileira de 2008, p. 43
Para o diretor da faculdade Innovare, a Constelação e Bert Hellinger foram perseguidos no mundo inteiro e “não dá para pegar uma fala dele de 30 anos atrás e colocar nos dias de hoje”. Ele garante que dentro da sala de aula o conteúdo é ensinado “com a linguagem atual” e que a maioria dos títulos estão sendo atualizados. Perguntada sobre planos para as reedições dos livros de Hellinger, a Editora Cultrix, que detém os direitos exclusivos sobre seis traduções no Brasil, confirmou que as obras estão sendo comercializadas normalmente e que não existem propostas para alterá-las no momento.
Pelo caráter mais “fenomenológico do que acadêmico” dos cursos oferecidos pela parceria Innovare-Hellinger, Inácio conta que, muitas vezes, os temas polêmicos, como uma discussão sobre a prática que ocorreu no Senado em 2022, são abordados em aula por meio da prática. “Abre-se uma Constelação, vemos o que o campo mostra e a resposta vem muito tranquila”. Apesar disso, ele defende que boa parte das críticas surgem de pessoas que utilizam de maneira errada o nome da Constelação Familiar e de Bert Hellinger, “porque isso dá muito Ibope e dinheiro”.
Ainda sobre as críticas, Inácio diz não rebater. “Quem fala mal de Constelação até hoje não conseguiu provar pra gente de onde veio a origem, quem reclamou, porque reclamou, do que reclamou. Então são tudo falácias”. Ele afirma que entende que algumas pessoas podem ter passado por um profissional e não ter se sentido bem, mas que os julgamentos que recebe são sem consistência. “Que nem essa crítica que veio do Conselho Federal de Psicologia, não tem embasamento. Exemplo, se eu vou acusar alguém, eu tenho que ter prova. Cadê as provas? Cadê a pessoa que fez a denúncia? Cadê o que aconteceu?”
O gestor da Innovare critica os profissionais que “fazem um curso de final de semana e já saem constelando”. Segundo ele, a expansão desordenada da Constelação fez com que Bert Hellinger, durante um almoço em sua casa na Alemanha dissesse: “Inácio, está uma bagunça a Constelação no Brasil. Tá na hora de arrumar”. Foi daí que em 2015, nasceu o Instituto Brasileiro de Consteladores Familiares (IBCF), sob o comando de Inácio e Renato Shaan Bertate, dando início ao movimento de “colocação da ordem”.
O IBCF é uma entidade independente de filiação voluntária, já que não existe Conselho profissional reconhecido para a prática da Constelação. O instituto orienta boas práticas a seus filiados, como respeitar a confidencialidade do cliente, não falar de forma depreciativa sobre Bert Hellinger e manter sua saúde física, mental e espiritual. Ainda não existe um órgão responsável por regulamentar a profissão de constelador ou receber denúncias e reclamações formais sobre más práticas.
Em mais de 15 anos de atuação na área, Lairton reconhece que “tem muita loucura por aí” e que na Constelação, assim como em outras profissões, há pessoas sérias e outras, não. Para ele, uma formação de qualidade é essencial para assegurar o profissionalismo e um bom indicativo - segundo ele - é ter aprendido com professores formados pela Hellinger Schule.
Já para a juíza de paz Mírtala Delmondez, a Constelação é uma vivência intuitiva e o grau acadêmico não importa, desde que o profissional compreenda bem as Leis Sistêmicas e comprove experiência prática. “Uma pessoa que só tem o Ensino Médio pode ter a formação e atuar como consteladora e quem já tem Ensino Superior pode fazer a especialização, que faz muita falta para a advocacia, para psicólogos, nossa! As pessoas estão deixando os consultórios de Psicologia para vir para terapeutas, porque o protocolo da Psicologia requer que exista todo aquele processo, e na Constelação você já identifica onde está o ‘nó’”.
Conferimos
Doutor Honoris Causa é um título honorífico que pode ser concedido por universidades a figuras consideradas proeminentes, mesmo que não possuam títulos acadêmicos. Apesar de não possuir valor acadêmico ou profissional, a denominação simboliza amplo reconhecimento das contribuições do homenageado em sua área de atuação.
Bert Hellinger foi reconhecido oficialmente por três universidades do mundo. Ele possui o título de Doutor Honoris Causa em Medicina Integrativa pela Universidade de Colombo, no Sri Lanka, em Constelação Familiar Sistêmica pela Université Jean Monnet, na França, e pela Universidade Multicultural CUDEC, no México. Destas, apenas a Universidade de Colombo aparece entre a posição 1001 e 1200 do ranking das 1499 melhores instituições do mundo, segundo a última edição do QS World University Ranking. A Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, ocupa o 85º lugar.
Hellinger não condenava o incesto e via o acontecimento como uma consequência do desequilíbrio numa família ou uma “tentativa fracassada de amar”. Em uma de suas passagens mais polêmicas, no livro A Simetria Oculta do Amor (1998, edição brasileira de 2008, p. 84), o criador da Constelação Familiar diz:
“Em sua forma mais comum, o incesto representa a tentativa de reequilibrar o dar e o receber na família — geralmente, mas nem sempre, entre os pais. Se assim for, o agressor foi privado de alguma coisa: por exemplo, o que ele faz pela família não merece o devido reconhecimento. Sob essa forma, o incesto procura corrigir o desequilíbrio entre o dar e o receber.
Existem, é claro, muitas outras formas de incesto, mas vislumbramos um padrão comum quando uma mãe com filha desposa um homem sem filhos. Embora o novo marido tudo faça por elas e se preocupe com seu bem-estar, seus esforços e necessidades são diminuídos, desdenhados, ignorados e, às vezes, até ridicularizados. O desequilíbrio entre o dar e o receber desenvolve-se quando o homem dá mais e a mulher recebe mais. Em semelhante situação, a mulher poderia restaurar o equilíbrio se mostrasse gratidão autêntica para com o novo marido: ‘Sim, é verdade que você dá e eu recebo, mas eu valorizo imensamente o que você faz. Desse modo, a restauração do equilíbrio não exigiria que se descesse a um nível tão destrutivo.’
Para a criança induzida a recuperar o equilíbrio entre o dar e o receber, ou praticar outras formas de incesto, a solução é dizer honestamente: ‘Mamãe, fiz isso por você’ e ‘Papai, fiz isso por mamãe.’ Às vezes, quando o homem está presente em pessoa, peço que o filho diga: ‘Faço isso por mamãe e faço voluntariamente.’ Algumas pessoas rejeitam a palavra ‘voluntariamente’, mas as vítimas confirmam que é importante.”
Embora o abuso sexual infantil e o incesto fossem frequentemente relativizados por profissionais da saúde e da Psicologia até meados dos anos 60 e 70, a visão de Hellinger contraria resoluções como a da Convenção dos Direitos da Criança publicada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1989, quase dez anos antes do livro.
Reportagem produzida por Jullia Gouveia e Karol Bernardi como Trabalho de Conclusão do Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina. Orientação da professora Stefanie Carlan da Silveira.